Leia a edição anterior: [perspectivas]
Você percebeu que hoje não é sexta… Mas precisava muito colocar as palavras no papel. É só assim que me reconheço melhor.
Em 28 anos, talvez nunca tenha precisado tanto de uma folha em branco à frente. Ela sinaliza tudo que foi decidido nos últimos dias: um zerar de tudo que ficou para trás e um convite à reconstrução.
Provavelmente, as próximas edições sempre tenham passagens sobre o momento que estou atravessando/vou atravessar por sabe se lá quanto tempo. Construir uma história linda, de quase quatro anos junto de alguém especial demais, é muito significativo.
O sentimento é repleto de dualidades quando tudo acaba com o amor ainda no ar, apesar do batalhão de dúvidas que nos circundavam e certamente seguirão circundando por um período imprevisível.
Esse desabrochar do peito foge muito às recomendações da minha mãe, por exemplo. Sei bem.
Ela diz (e diria) que isso aqui é um prato cheio pra quem celebra minhas derrocadas na vida.
Porém, acredito — à parte aos meus pontos de imaturidade — que cheguei à conclusão de algo importante nesse estágio do meu caminhar: a ode às minhas próprias vulnerabilidade/fragilidade/fraqueza é maior do que o medo da energia de quem se senta no camarote e aplaude todas as minhas quedas. Quero crer que nas arquibancadas há mais gente que me quer bem do que o contrário.
O término de um relacionamento é muito semelhante à vivência de um luto. A começar pela oscilação de sentimentos. Vocês ficam confusos antes do veredito, decidem depois de muito pensar, aí parecem “desdecidir” e assim sucessivamente… A batalha entre a aceitação e a não aceitação também é das mais complexas.
Isso sem falar em tantos detalhes que a gente nota…
As roupas que demoram um tanto pra serem organizadas no guarda-roupa da pessoa que ama são desarrumadas numa velocidade extremamente desproporcional. Só que o luto em vida talvez seja bem pior. A gente morre de medo de nunca mais ver a pessoa que ainda é tão importante, que você tem certeza sobre ser uma das mais incríveis de toda a vida e que somou tanto nos últimos anos. A decisão pelo afastamento pra respeitar a ação do tempo faz com que, do dia pra noite, nos tornemos completos desconhecidos. Essa parte é das mais doloridas, aliás.
Na estrada de retorno ao conhecido que não parece mais tão conhecido assim, de repente, a vontade é dar um cavalinho de pau, voltar e dizer: “não, não é possível que estamos acabando”.
Tudo é estranho no começo. O choro vem sem avisar infinitas vezes. Seja quando toca Dia Branco, seja quando você olha ao lado e vê um casal sorrindo, de mãos dadas… Qualquer motivo é motivo.
O nosso comportamento também é estranho. A casa que foi seu lugar durante a maior parte da vida fica sem graça demais no começo. Parece cinza. Você parece ter uma amnésia de identificação, mal sabe onde ficam os potes, os itens básicos. Não há muitas pistas do que fazer pra mudar o fluxo dos pensamentos que só tem um nome.
Até nossos mecanismos de defesa são peculiares. Você quer evitar lavar a louça durante alguns dias pra não se lembrar daquela que era uma de suas tarefas genuínas ao lado do seu amor.
Mas, entre tantas incertezas, uma verdade absoluta: a ciência de que todo esse novo desenho é parte de um processo importante. Durante esses anos, felizmente, nossa história teve tantos sorrisos, gargalhadas, brincadeiras, amor, obviamente, e bem mais requintes de parceria e cumplicidade do que qualquer outra coisa…
No entanto, também não passou ilesa aos erros e quebras. Eu, que sempre me considerei maduro ao extremo pelas circunstâncias de uma infância dolorida, fiz escolhas, tive perda de consciência e me envergonhei por ser falho. Em vários momentos recentes, alimentei os piores sentimentos sobre a minha imperfeição.
Dava vontade de desistir tudo porque nossa cabeça pode ser o monstro mais terrível de todos. Nela, embora viva o melhor de nós, também fica logo ao lado nossa pior versão, às vezes bem escondida, esperando a primeira oportunidade de dar as caras.
Nesse recomeço, o primeiro passo é aprender, evoluir e melhorar a partir da dor. Sofrer é uma forma de reconhecer que precisamos ser pessoas mais evoluídas — se não tivéssemos, inclusive, dificilmente faria sentido nossa existência. E de ter certeza que ainda seremos vilões em vida, mas que também podemos escolher descartar e nunca mais agir com alguns traços não aceitáveis dessa vilania.
Quando o tempo passar e o processo estiver mais amadurecido, será possível fazer novas reflexões.
A primeira delas é a de justamente pensar se ainda há tempo pra retomar aquele amor. Essa é das mais implacáveis de todas porque, durante esse afastamento, você sempre pensa que, na próxima esquina da vida, a pessoa vai encontrar a verdadeira comédia romântica perfeita, com alguém bem mais especial. E seus dedos, aqueles que encontravam e entrelaçaram tantas vezes nos dela, tão facilmente, já não farão mais parte do toque mais desejado.
Na imprevisibilidade de nossas rotas, tudo pode acontecer. Inicialmente, nos resta acreditar que nada é por acaso. Sempre há respostas, muitas vezes as mais difíceis de decifrar, às nossas mudanças de direção.
Torço pelos melhores caminhos a cada um de nós. E que o destino se cumpra como a maior lição desses anos todos: o que é nosso vai nos encontrar da melhor maneira possível. Já está escrito como há de ser. Cabe a nós fazermos as descobertas em meio à saudade e ao turbilhão de sentimentos que nos habita.
Recomendações de hoje pra aliviar…
Como diz @oemputecido na rede do Musk:
"não vou pensar mais nisso"
eu 5 minutos depois:
- Leia esse livro
- Fofura corinthiana
- A vida é esse tecido que o Galeano diz
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Até logo! 😘
É, seu Esdras. Esse momento não é fácil. Tanto tempo e energia investidos em algo que não parecia ter um prazo de duração e simplesmente... desaparece, né? Que essa reconstrução venha para o melhor!
PS.: se quiser uma recomendação de trilha sonora, vai de Poke, do Frightened Rabbit. Provavelmente é a melhor música sobre um término que eu conheço e casa bastante com várias coisas que você escreveu :)